TUDO SOBRE A COMUNIDADE DAS ARTES

Ajuda-nos a continuar a ajudar a comunidade na busca de oportunidades, e a continuar a levar-te conteúdos de qualidade.

Ajuda-nos a continuar a ajudar a comunidade na busca de oportunidades, e a continuar a levar-te conteúdos de qualidade.

Selecione a area onde pretende pesquisar

Conteúdos

Classificados

Recursos

Workshops

Crítica

Artigos
Cartas ao Panteão

Cartas ao Panteão (XVII)

Por

 

Ricardo Cabaça
27 de Março de 2024

Partilhar

Cartas ao Panteão (XVII)

Meu caro Shakespeare,

 

Escrevo esta carta no Dia Mundial do Teatro, uma celebração que surge muito depois da tua morte, mas que por certo o teu trabalho em muito contribuiu para que hoje se celebre, uma vez por ano, a nossa arte. A mensagem deste ano, lida um pouco por todo o mundo, foi escrita por Jon Fosse, um escritor norueguês que recentemente ganhou o Nobel. Um dia explico-te o que é o Prémio Nobel da Literatura. Confesso que não é muito fácil escrever uma carta para ti, não por não pertenceres ao meu panteão, mas sobretudo por não conseguir identificar quando abriste a porta e entraste nele definitivamente. Toda a gente já ouviu falar do teu Romeu e Julieta, conhece o nome, mas nem todas as pessoas sabem quem escreveu a peça. Muitas menos a terão lido. Antes de saber quem era o autor daquela peça tão famosa, já eu ouvia falar do amor impossível entre Romeu e Julieta, um jovem casal apaixonado condenado à desgraça e à separação.


Anos mais tarde tudo mudou, passei a ser íntimo da tua obra, a conhecer as tuas peças e a reconhecer, finalmente, a dimensão da tua figura. Hoje o consenso é amplo: és reconhecido como o maior dramaturgo de todos os tempos. Admito que tenho alguma resistência à expressão, sobretudo pela impossibilidade de comparar obras e épocas, mas também pela dificuldade em destronar um mito para colocar outro no lugar, mas aceito que sejas o melhor de todos os tempos.


Há uns anos visitei o teu “teatro” em Londres, e durante todo o tempo em que estive lá procurei-te em toda a parte, pensando que podias estar em qualquer parte, como afinal de contas estavas. Será que nos cruzámos na tua cidade? Foi um privilégio poder caminhar por aquilo que seria o teu teatro, estar em pé onde esteve o teu público, a ouvir as vozes vindas de um palco que tão bem conhecias. Não deixo de ficar espantado sobre as horríveis condições em que o fenómeno teatral era apresentado, talvez semelhantes àquelas em que as pessoas viviam na época das tuas palavras. Na verdade, o génio floresce, por piores que sejam as condições do mundo.


Tenho por hábito saudável falar de ti aos meus alunos de dramaturgia: a forma como desenvolveste o texto teatral, a amplitude de temas, a perfeição da tua escrita, as personagens intemporais que desenhaste, as mulheres poderosas que estão nas tuas peças, parece que tudo em ti é perfeito, até mesmo as possíveis fraquezas podem ser encaradas como perfeições de um trabalho imenso. É soberbo como falaste de amor, de fantasia, de teatro, de história, de guerra. De guerra. O Jon Fosse também fala de guerra na sua mensagem escrita para o dia de hoje. Sei que não são as minhas palavras para ti, mas sinto que faz todo o sentido partilhá-las contigo.


A guerra é a batalha contra aquilo que está profundamente no nosso íntimo: algo único. E é também a batalha contra a arte, contra aquilo que está profundamente no íntimo de toda a arte. Tenho mencionado a arte em geral, e não o teatro ou a dramaturgia em particular, mas isso é porque, como já disse, toda a arte boa, no fundo, orbita sobre a mesma ideia: pegar naquilo que é totalmente único, totalmente específico, e torná-lo universal. Unindo o particular com o universal através de formas de o expressar artisticamente: sem eliminar a sua especificidade e deixando brilhar claramente aquilo que é estrangeiro e não familiar.

A guerra e a arte são opostas, tal como a guerra e a paz são opostas – é tão simples quanto isto. Arte é paz.


Na tua obra são inúmeras as referências à guerra, ao ódio e à barbárie, mas sei que eras um homem de paz, por isso sei que as palavras de Fosse serão recebidas por ti com toda a solidariedade.


Meu querido William, o mundo que deixaste está miseravelmente doente, os tiranos habitam cada canto do planeta, o sangue explode a cada respiração. Seria, sem dúvida alguma, um tempo ideal para continuares a escrever as tuas peças, nada faria mais sentido.


Não posso precisar se foi em tua homenagem, até porque o nome é belo demais, mas o meu filho chama-se Romeu, e cada vez que o digo parece que estou a chamar por ti. Mas tu nunca vens. Por enquanto.

 

Um abraço afetuoso do teu amigo e admirador,

Apoiar

Se quiseres apoiar o Coffeepaste, para continuarmos a fazer mais e melhor por ti e pela comunidade, vê como aqui.

Como apoiar

Se tiveres alguma questão, escreve-nos para info@coffeepaste.com

Mais

 

Artigos

Segue-nos nas redes

Cartas ao Panteão (XVII)

Publicidade

Quer Publicitar no nosso site? preencha o formulário.

Preencher

Inscreve-te na mailing list e recebe todas as novidades do Coffeepaste!

Ao subscreveres, passarás a receber os anúncios mais recentes, informações sobre novos conteúdos editoriais, as nossas iniciativas e outras informações por email. O teu endereço nunca será partilhado.

Apoios

01 República Portuguesa
02 Direção Geral das Artes
03 Lisboa

Copyright © 2022 CoffeePaste. Todos os direitos reservados.

Desenvolvido por

Cartas ao Panteão (XVII)
coffeepaste.com desenvolvido por Bondhabits. Agência de marketing digital e desenvolvimento de websites e desenvolvimento de apps mobile