Pedro Catarino destaca desafios e oportunidades na relação entre Portugal e China 25 anos após transferência de Macau

A poucos dias de se completarem 25 anos desde a transferência de Macau para a China, Pedro Catarino, embaixador em Pequim durante o processo, avaliou a relação luso-chinesa como "correta", mas também marcada por desafios crescentes. A transferência do território, a 20 de dezembro de 1999, deu início a um período de 50 anos em que Pequim se comprometeu, junto da ONU, a manter o sistema socioeconómico de Macau inalterado.

Na opinião do diplomata, atual representante da República para os Açores, o primeiro quarto de século foi pautado pela "correção" nas relações bilaterais, apesar de estas serem "difíceis, complexas e delicadas". No entanto, as políticas da liderança de Xi Jinping trazem novos desafios.

Pedro Catarino sublinhou que a estratégia chinesa evoluiu desde a abertura promovida por Deng Xiaoping, que combinava socialismo com elementos de mercado. “Com Xi Jinping, houve uma inflexão enorme”, afirmou, prevendo que os próximos 25 anos serão cruciais para consolidar a singularidade e diversidade de Macau, bem como para reforçar a relação histórica entre Portugal e a China.

Embora Portugal deva estar atento às decisões de Pequim, Catarino defendeu que o país não pode negligenciar as suas vantagens históricas e culturais. “Devíamos ser mais assertivos, procurando fazer valer as nossas vantagens competitivas em relação aos chineses”, disse, apontando para a necessidade de uma abordagem mais proativa na proteção de interesses nacionais.

O diplomata destacou dois cenários onde Portugal pode tirar partido da sua relação histórica com a China: os países africanos de língua portuguesa e o próprio território de Macau. Recordando um episódio de 2002, quando Pequim anunciou África como prioridade, Catarino lamentou que Portugal tenha tido uma resposta "tíbia" e não tenha aproveitado as oportunidades de parceria empresarial propostas pela China.

“Os chineses avançaram com créditos de biliões de dólares e entraram em África em grande estilo, enquanto Portugal não designou sequer um responsável governamental para articular esforços”, criticou. Catarino acredita que o país poderia ter desempenhado um papel mediador, oferecendo sensibilidade social a projetos chineses no continente africano.

No caso de Macau, o embaixador destacou o potencial do território como ponte para empresas portuguesas entrarem no mercado chinês. “Temos vantagens competitivas, como uma massa crítica de juristas especializados em advocacia de negócios”, disse, mas reforçou que é necessária “vontade política e empresarial” para aproveitar estas oportunidades.

Pedro Catarino enfatizou que, embora Portugal deva respeitar as diretrizes europeias, não pode abdicar de uma relação equilibrada com a China. O diplomata aposentado defende que o país deve usar a sua história e experiência como ferramentas para negociar de forma mais assertiva nos próximos anos.

“Temos de procurar uma relação saudável, que traga benefícios e proteja os nossos interesses”, concluiu, deixando um apelo para que o próximo quarto de século da Declaração Conjunta sobre Macau seja aproveitado como uma oportunidade de cooperação estratégica entre os dois países.

Foto: © drown_ in_city